Muito se tem falado acerca de amor e ódio. Porém, certa vez ouvi dizer que o contrário do amor não é o ódio, mas sim, o medo. Já havia me questionado sobre o amor diversas vezes, pesquisado sobre o tema em linhas diversas, porém, até aquele momento, não tinha visto nada como tal afirmação. Já que sempre busco entender as coisas a partir de mim mesmo, analisando, ou entrando em contato com os meus próprios sentimentos, comecei a me aprofundar na exploração desse tema.
Em minhas meditações eu conseguia sentir que o amor verdadeiro, independentemente de questões relacionadas à atração sexual ou afetiva, era muito mais ligado a algo voltado à integração, à união, à igualdade, à empatia; ou seja, o amor seria a conexão com tudo e com todos, o fator neutralizante de toda e qualquer diferença. Ele tendia muito mais ao zero, do que ao um, ou ao dois.
Como já havia obtido alguma compreensão sobre o amor, minha intenção era, agora, a de definir o que seria contrário a ele. Pesquisei, estudei algumas linhas esotéricas e espiritualistas, algumas orientais, mas não havia encontrado essa afirmação em qualquer lugar. Comecei a me questionar, então, de onde ela teria vindo. Foi então que percebi que a primeira pessoa a afirmar tal coisa deve ter se baseado em suas próprias observações acerca de si mesmo.
Sendo assim, busquei entrar em contato com minhas emoções e sentimentos para ver o que eu poderia encontrar ali. Não tardou e entendi que, o que tal afirmação buscava dizer, na verdade, seria: "não conseguimos amar aquilo que tememos". Ora, mas isso parece óbvio! E, de fato é, porém, alguém teve de se colocar em tal processo de auto-observação para chegar até essa conclusão. Quantas obviedades poderíamos descobrir, se estivéssemos empreendendo o mesmo processo, igualmente profundo e legítimo, conosco mesmos?
Quando vamos analisar tal conceito caímos, por consequência, em várias outras questões que podem ser polêmicas. Eu irei abordar algumas delas aqui, mas deixo claro que não me encontro realizando um julgamento sobre o que seria certo, ou errado, somente apresentarei fatos e irei analisá-los sob essa ótica.
Ao entendermos que não conseguimos amar aquilo que tememos, concluímos que existe um abismo entre amar a Deus e temê-lo, ao mesmo tempo. Como isso seria possível? Da mesma forma, como um filho poderia amar o seu pai, se o mesmo lhe representasse uma figura ameaçadora, digna de temor? Como poderíamos realizar boas ações, verdadeiramente, se a nossa única motivação para fazê-las reside no medo que temos de ir para o inferno? Será que o medo que temos de errar nos permite amar, integralmente?
Quando falamos em uma imagem de Deus, ou em uma inteligência superior que a tudo criou, naturalmente, atribuímos a ela um imensurável poder! Para a visão humana, o poder é algo soberano, pois, quem o tem, tem tudo. Dessa forma, nos é facultado que essa imagem divina possa realizar qualquer coisa, já que possui o poder de criação e destruição. Com isso, algumas instituições se atribuíram de tal arquétipo para representarem o “poder do Poderoso”, na Terra.
O problema é que, autoinvestidas de tal poder, dizem o que é “certo” e o que é “errado”, afirmam e reafirmam as consequências nefastas, planejadas por Deus, para todos aqueles que errarem, criando uma cultura do medo, ao mesmo tempo que pregam o amor a Ele! Revestidas de todo esse poder, como as pessoas poderiam duvidar, considerando que, se elas questionarem, ou duvidarem, estariam duvidando do próprio Deus e, consequentemente iriam para o inferno? Então, é melhor amar a esse Deus e segui-lo, se não quiser ter a vida destruída.
Assim como a imagem de um Deus destruidor que deve ser amado, amedronta e confunde uma grande parte das pessoas, também seria a imagem de um pai violento que, sendo pai, empiricamente, deveria ser amado, mesmo não promovendo o amor. Os filhos dele seriam confusos e temerosos, mas ainda assim, muito dependentes, pois sentiriam o dever de amá-lo a qualquer custo, pois, se não o fizerem, as consequências poderiam ser ainda piores para eles. Infelizmente, sob essas circunstâncias, a confusão e o temor cegam a visão dos envolvidos, não fazendo-os perceber a ausência do próprio amor. A pergunta que fica é: como um pai, verdadeiramente amoroso, iria ser a fonte do medo de seus filhos?
Sob este aspecto, também nos questionamos se as nossas boas-ações são realizadas por nossa própria vontade autogerada, ou são resultados das imposições constantes para que possamos “agradar a Deus”. Cada vez mais a experiência humana vai sendo programada e induzida, ditada por padrões que nos impedem de conceber a realidade tal como ela é, nos afastando do contato interior, baseando-nos em preceitos externos, em normas de conduta que favorecem somente àqueles que as criaram, pois nos mantém totalmente previsíveis em nossos pensamentos e ações.
Essas questões nos fazem refletir sobre muitas estruturas psicológicas que temos, definidas por diversos tipos de valores aos quais fomos apresentados. Sendo assim, como poderíamos amar o morador de rua, se tememos que ele possa vir nos abordar para pedir algo, ou já o julgamos, acreditando que ele possa nos roubar? Acredito que tenhamos que realizar uma profunda análise de consciência para ressignificarmos muitas coisas e situações de nossas vidas, a fim de que seja possível desenvolvermos o amor, verdadeiramente.
Agora gostaria de aprofundar um pouco mais a questão. Já concordamos que não amamos, verdadeiramente, aquilo que tememos, mas será que poderíamos dizer que o contrário do amor é mesmo o medo?
Quando falei que estive meditando sobre o amor, disse que ele seria um fator neutralizante de toda e qualquer diferença. Se entendemos o amor por essa ótica, concluímos que não só o ódio seria contrário a ele, mas também: o julgamento, a repressão, o bullying, a exclusão etc. Tudo o que não contribui para a igualdade e a união é contrário ao amor. Muitos de nós possuem opiniões diferentes e até opostas umas das outras, mas nunca poderemos ser contrários aos outros. Aceitar a opinião alheia é amar, pois integra, reconhece dois seres com os mesmos direitos de terem pensamentos diferentes.
Com isso, entramos em outra coisa que, por incrível que pareça, pode ser contrária ao amor. Se o amor anula toda e qualquer diferença, por que então optamos por enxergar as nossas diferenças? E a resposta é simples: para nos sentirmos diferentes!
Ego. Podemos entender que toda e qualquer ação que promova o nosso ego, já não estaria de acordo com o amor, pois todos somos semelhantes e estamos em constante evolução. O que eu sei hoje, alguém saberá amanhã, mas outro já sabia antes de mim. O que eu acho que é certo agora, amanhã pode não ser. Por que a competição?
A vida, em si, é dinâmica. Isso é ótimo! Por que basearmos nossas vidas nas diferenças, se aquele que eu via como diferente de mim, amanhã poderá pensar da mesma forma que eu, ou vice-versa? O que manteria a diferença depois? Como meu conceito, ou pré-conceito sobre aquela pessoa poderia se justificar posteriormente? Das duas, uma: eu teria que mudar novamente a minha opinião para me manter diferente dela, ou eu deveria reconhecer que somos iguais. Será que percebemos quão insignificante é o ego?
Para concluir, quando quisermos saber se algum pensamento, palavra, ou ação é contrária ao amor, basta que lembremos que o amor é o fator que neutraliza toda e qualquer diferença! Se a nossa atitude nos levar a esse resultado, estaremos agindo em prol do amor, caso contrário, devemos avaliar o nosso interior e descobrir os porquês de estarmos agindo de tal forma.