Em muitas das leituras que fiz, ou mesmo dos conteúdos que estudei, percebia uma relação oposta entre vontade e desejo. Muitas vezes a diferença entre ambos não era clara, nem mesmo existia em um único artigo, ou tema, porém, de forma bem sutil, percebia que ela existia. Desde então, busquei encontrar algumas respostas que hoje irei compartilhar aqui com vocês.
Em linhas de estudos orientais, percebia que os grandes mestres pregavam acerca da anulação dos desejos. Contextualizando brevemente, a visão da filosofia oriental diz que os desejos são a origem para todo o sofrimento existente, pois fazemos com que nossa vida passe a girar em torno de alcançá-los.
Já nas linhas ocidentais a questão do desenvolvimento e execução da vontade é muito abordada. Em resumo, é dito que sem a vontade bem definida, é impossível que possamos manifestar algo de uma maneira completa, com boa qualidade e definição; ou seja, darmos forma a algo ou a alguma coisa.
Mas, desejo e vontade não são a mesma coisa?, me perguntava. Então, como eu poderia anular meus desejos, se precisaria exercer e aprimorar a minha vontade? Ali havia um sério antagonismo!
É muito fácil pensarmos: “se eu desejar algo, posso conseguir”, ou “se eu tenho vontade de fazer isso, vou conseguir”; porém, com o tempo fui percebendo que, apesar dessas duas sentenças aparentarem um mesmo significado, existia ali uma diferença gritante entre elas!
Para começarmos a aprofundar um pouco mais a análise, vamos entender a origem das palavras, pela sua etimologia. A palavra “desejo” vem de “DESIDERIUM”, do latim, que significa “esperar por, aguardar por, ter expectativa"; já a palavra “vontade”, vem de “VOLUNTAS”, também do latim, que significa “ânimo, querer intenso”.
Com essas definições já conseguimos entender que, em sua origem mais profunda, as palavras não possuem o mesmo significado, pois podemos ter o desejo, sem a vontade e a vontade, sem o desejo.
Para exemplificar, imagine que alguém esteja procurando um emprego. Essa pessoa coloca seu currículo em uma agência de empregos e candidata-se a qualquer oportunidade que aparecer. Dois meses depois, esse alguém percebe que ainda não teve resultado, mas resolve ficar aguardando.
Agora, imagine uma outra pessoa na mesma situação, porém essa, em uma semana, já resolve ligar na agência para ter algum parecer e, no mesmo dia, já procura na internet algumas vagas de emprego e se candidata a algumas delas. Uma semana depois, ela já consegue uma vaga e retira seu currículo da agência, atualizando seu perfil.
Pois bem, neste caso, quem teve o desejo e quem teve a vontade de trabalhar?
A primeira pessoa só possuía o desejo, ficou esperando que a oportunidade aparecesse, porém, a segunda, enquanto a outra esperava, em um tempo bem menor, já conseguia se estabelecer em uma atividade remunerada.
Um outro exemplo bem comum, porém um tanto imperceptível, é o do jogo de futebol.
Os jogadores de futebol de um determinado time treinam constantemente com sua equipe, várias vezes por semana, por horas seguidas, para enfrentarem seus adversários no campo em uma data determinada. No dia do jogo derradeiro, os jogadores de ambos os times entram em campo e os times se enfrentam. Das arquibancadas, naquele dia, os torcedores apoiam seus times favoritos. Novamente, quem são aqueles que exercem a vontade e quem são aqueles que somente desejam a vitória de seus times? [Pergunta retórica].
Devemos escolher se somos aqueles que se esforçam para melhor chutar a bola, ou aqueles que torcem para que quem a chutou, possa acertar o gol.
Ao aprofundarmos mais a análise, percebemos que o desejo está totalmente fora de nosso controle, pois conta com variáveis externas a nós mesmos. Ele faz com que o ser se estagne e espere encontrar o ideal para si, sempre fora de si, através de coisas, lugares, pessoas, situações, etc.
A vontade, pelo contrário, já está totalmente dentro de nosso controle, pois escolhemos exercê-la em prol de realizarmos algo que esteja partindo de nosso ânimo (vida, alma). Ela vem de nosso interior e é a nossa ferramenta de autorrealização, pois através de sua utilização, conseguimos construir e conquistar aquilo que almejamos.
Esperar que o desejo seja realizado, é excluir-se como um ser dotado de vontade.
Depois de entender a diferença real entre estas duas palavras, meu aparente antagonismo interpretativo cessou e comecei a compreender que a vontade deve ser sempre exercida, desde as coisas mais simples, até as mais complexas, pois é necessário que sintamos que somos os protagonistas de nossas próprias vidas. A força que adquirimos em vida, independentemente de como, sempre é resultado de uma vontade bem direcionada e aplicada.
Entendi que não devo ter desejos, desde os mais simples, até os mais elaborados, pois eles contam com a ação externa a mim, com as atitudes de outras pessoas, com eventos que estão no futuro. O desejo nos causa um mau-hábito de esperarmos que o mundo se comporte da forma como nós desejamos. Isso é bom para o ego, pois nos eximimos de nossas responsabilidades para conosco mesmos, para com o nosso próprio aprimoramento integral como seres humanos.
Mas, então, como viver sem desejar? Aguarde um próximo artigo deste site, que falará sobre Leia o nosso artigo: Plano vs. Propósito.